terça-feira, 28 de abril de 2020

China e a política da diplomacia dos estádios

“Tática” diretamente ligada a construção de estádios e infraestrutura é arma chinesa há muitos anos, como aproximação diplomática.

Num Mundo totalmente globalizado, todos somos conscientes que o futebol é o esporte mais praticado no nosso planeta. Assim sendo, o futebol, como fenômeno mundial, naturalmente se converte num fato de ordem geopolítica, deixando de ser apenas algo inerente ao campo de jogo, as estrelas que constituem o espetáculo, passando, intensamente, para o que há alguns anos sabemos como “jogo de bastidores”.

E nesse “jogo de bastidores”, na atual realidade, poucas nações sabem fazer o mesmo tão bem quanto a China, exercendo alta influência em países pouco desenvolvidos e justamente, via futebol, indo além; oferecendo a oportunidade real da criação de uma infraestrutura em torno da temática desportiva (estádios, centro de treinamentos, etc). Cientes da necessidade de demais obras vitais, que envolvem a construção de um estádio, como ruas, trens, metrôs, hospitais, aeroportos, etc e compreendendo a dificuldade que países subdesenvolvidos possuem, em função do alto custo, os chineses chegam, estrategicamente, preenchendo uma lacuna e conquistando influências.

Presidente bielorrusso, Alexander Lukashenko e o presidente chinês Xi Jinping. Governo de Pequim já anunciou a doação de um estádio para a Bielorrússia. (foto: Reuters/Lintao Zhang)

No Mundo temos pelo menos 40 países com estádios que foram desenvolvidos diretamente pelo governo da República Popular da China, sem levarmos em conta os que foram edificados por empresas chinesas. A maioria na África, mas os chineses também construíram em países do Caribe, da Ásia e Oceania.

A grande jogada

Muitas pessoas podem, num paralelo, pensar consigo, mas qual o interesse chinês, além de conquistar aliados e exercer sua fortíssima influência sobre países com baixos índices de desenvolvimento?

Uma característica dos investimentos, é que os mesmos são em países com recursos naturais, uma forma de, a longo prazo, se pagar todo o investimento, ou, numa outra estratégia, abrir as portas para empresas privadas da China; ficando “tudo em casa”.

Em construção, o Stade Olympique d’Epimbé, é um presente da China para a Costa do Marfim, por ocasião da CAN2023 (Foto: reprodução)

Outro detalhe está no fato que a maioria desses países, são esquecidos pelos europeus e norte-americanos. Assim, a China aproveita a lacuna existente, para construir/fortalecer influência em determinadas regiões; elevando favores diplomáticos. Tratados de livre comércio é outra moeda de troca, utilizada para o pagamento dos estádios.

Um exemplo claro, que envolve questão diplomática é a relação China – Costa Rica; entre 2008 e 2011, o governo chinês construiu, bancando 100% da obra do Estádio Nacional e doou o mesmo para a nação centro-americana, como forma de coroar o êxito nas relações entre os dois países, iniciadas em 2007.

Estádio Nacional da Costa Rica, o mais moderno da América Central (Foto: reprodução)

Em 2010, a Costa Rica deixou de reconhecer Taiwan como nação independente, atendendo obviamente senão pedido, mas a vontade do governo de Pequim. Em dezembro de 2018, o governo chinês doou 11 milhões de dólares aos costa-riquenhos para obras de modernização do Estádio Nacional, com capacidade para 35 mil torcedores é considerado o mais moderno da América Central.

E o futebol?

Claramente, a estratégia chinesa, em termos econômicos, se mostra muito eficiente, tendo outros tentáculos no mundo dos negócios com nações que carecem de uma “atenção maior” por parte das demais potências da economia mundial.

Entretanto, há também espaço nos bastidores para que os chineses tenham influência muito forte no meio futebolístico e essa ascendência é nítida sobre a Confederação Africana de Futebol (CAF) e aos poucos, a China vai ganhando força dentro da FIFA, porém, de maneira discreta, sem alardes.

A Copa Africana das Nações de 2017, realizada no Gabão, por exemplo, contou com 100% de participação estatal e privada chinesa, na construção dos quatro estádios que sediaram jogos da competição. Nesse caso, não somente os estádios como toda a estrutura em torno dos mesmos, também têm capital chinês.

Stade d’Angondjé, em Libreville, Gabão, também é conhecido como Stade d’Amitié Sino-Gabonais (Foto: reprodução)

Na Guiné, o Stade General Lansana Conté, popularmente também conhecido como Stade Nongo com capacidade para 50.000 lugares, foi terminado em 2012, como presente do governo chinês para o país. Como a Guiné foi selecionada para sediar a Copa das Nações Africanas de 2025, foi assinado um acordo entre dois países para a construção de mais três estádios.

O peso da imagem chinesa

Há anos que a China economicamente está aberta ao Mundo e talvez sejam os chineses hoje, a nação que mais negócios fazem com outras nações no Mundo e justamente, criar laços com países de culturas diversas, via investimentos em infraestrutura melhora a imagem da China.

No infográfico abaixo, com base numa pesquisa de opinião do portal Afro Barometer, que mede diversos índices no continente africano, podemos ter uma noção da força da imagem do governo chinês em 36 países.

Essa visão que envolve a união, estratégica, de negócios e suas futuras oportunidades vem, com mais frequência, desde a década de 80, entretanto, com os fatores de desenvolvimento econômico e a globalização, os chineses passaram a utilizar com ênfase essa tática neste novo século.

O lado de lá…

Obviamente, podemos de modo geral pensar, acerca da real necessidade de nações com dificuldades financeiras terem estádios modernos, o que isso significa?

Há o lado político, há o aspecto que são obras que acabam tendo um ou outro crítico, mas há sobretudo, o “afago” aos egos dos governantes e seus apoiadores. No aspecto esportivo, os estádios modernos permitem a esses países receberem um ou outro evento, equipes de grande porte da Europa, que além do dinheiro, exigem instalações esportivas de alto nível. Por exemplo, em julho de 2017, o Everton se tornou o primeiro clube da Premier League a jogar na Tanzânia.

Wayne Rooney com um guerreiro Maasai, na Tanzânia (Foto: Twitter/Everton)

Ante 40 mil torcedores presentes no Tanzania National Main Stadium, em Dar es Salaam, presenciaram Wayne Rooney e companhia, vencerem o Gor Mahia, do Quênia por 2×1 em jogo que muito além do resultado, entrou para a história dos eventos esportivos da África Oriental.

Enfim, a China oferece, estrategicamente, “ótimas” condições em termos de pagamento, isso quando os chineses não “doam” tudo para esses países em subdesenvolvimento, além de oferecer excelente infraestrutura, algo que raramente os países ocidentais fazem, começando pelo próprio interesse destes. E é importante imaginarmos que essa relação de diplomacia dentro do futebol, da parte dos chineses, tende a ficar mais forte ainda, vislumbrando o cenário atual, num período pós-pandemia; pois no final das contas, tudo são negócios.

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